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domingo, 28 de outubro de 2012

Capítulo 5 - HItory : "They Don't Care About Us"

 
2.                THEY DON’T CARE ABOUT US

(Escrita e composta por Michael Jacson. Produzida por Michael Jackson. Cordas arranjadas por Michael Jackson. Vocais: Michael Jackson. Teclados e programação: Brad Buxer, Chuck Wild, Jeff Bova e Jason Miles. Guitarra: Trevor Rabin e Rob Hoffman. Coro infantil de Los Angeles conduzido por Annette Sanders)
 

“They Don’t Care About Us” é uma das mais ponderosas músicas de protestos que surgiram nos anos 90. No meio do intenso tumulto politico e racial da época (Rodney King, revoltas raciais, O. J. Simpson, James Byrd Jr.), ela apresenta uma pancada direcionada contra um aparato de poder abusivo, corrupto e opressivo. Interessantemente, enquanto a música se tornou um hit Top Ten em países em todo o mundo, ela não conseguiu passar da 30º posição nos Estados Unidos. Apesar de ser desdenhada (e estigmatizada) nos Estados Unidos, contudo, “They Don’t Care About Us” permanece como umas das mais fortes faixas de todo o catálogo de Jackson. 

Ela também se tornou a mais controversa dele. Antes de HIStory sequer ser lançado, Bernard Weinraub, do New York Times, descreveu todo o álbum como “profano, obscuro, furioso e cheio de raiva”. Em particular, ele assinalou “They Don’t Care About Us”, chamando-a de “visivelmente crítica aos judeus”. Weinraub estava se referindo às linhas: “Chame-me de judeu, processe-me/Todo mundo acabe comigo/ Chute-me, chame-me de kike/ Mas não me chame de preto ou branco”, as quais, ele alegou, eram claramente antissemitas. No contesto da música, é claro, Jackson estava tentando o exato oposto. “A ideia de que esta letra poderia ser considerada censurável é extremamente dolorosa para mim e enganosa”, ele disse em uma declaração. “A música, na verdade, é sobre a dor do preconceito e ódio e é uma forma de atrair a atenção para problemas sociais e políticos. Eu sou a voz do acusado e do atacado. Eu sou a voz de todos. Eu sou o skinhead, eu sou o judeu, eu sou o negro, eu sou o branco. Eu não sou o que está atacando. Isso é sobre injustiças para pessoas jovens e como o sistema pode, erroneamente, acusa-los. Eu estou como raiva e ultrajado por eu poder ser tão mal interpretado.” 

Essa declaração não impediu que os críticos se amontoassem e rotulassem Jackson, que tinha números amigos íntimos judeus, como um antissemita. Na revisão de HIStory, Jon Pareles, do New York Times, foi tão longe quanto alegar que “[Jackson] entrega a mentira de todo o catálogo dele, de temas de irmandade, com uma rajada de antissemitismo.” A narrativa rapidamente pegou e se espalhou como fogo. Outros, contudo, particularmente na comunidade afro-americana, defenderam Jackson, alegando que o uso da linguagem dele não era diferente de como os rappers usavam o termo “crioulos” como um artifício retórico de “discurso invertido”, a ideia é fazer epítetos carregados e implantá-los para as extremidades opostas. 

Sob contínua pressão, porém, Jackson acabou gravando uma versão alternativa da música, que borrou sobre a letra “ofensiva”; além disso, a Sony incluiu uma explicação e desculpa em todos os álbuns subsequentes.  

Negligenciada na fabricada controvérsia foi a música em si mesma: um rap-pop híbrido brilhante, politicamente potente, inspirado nas ruas. Ela se tornou uma música que não apenas ressoou para os marginalizados na América, mas também para aqueles em todo o mundo. Sonoramente e liricamente ela bate como uma marreta, com Jackson lançando rimas sobre uma crepitante batida militar, cordas sinistras e refrão inesquecível. Ela é um hino dos oprimidos, um rap de resistência. “O ritmo percussivo da música poderia ser as palmas de um jogo escolar ou o protesto feito com vigorosos tapas em um balcão”. Observa Armond White.

Na verdade, a faixa começa com que soa como o pátio de uma escola urbana, como uma mulher guiando crianças em um canto chamada-e-resposta de indignação: “Tudo que quero dizer é que eles não se importam realmente conosco... Chega, chega deste lixo.” Para aqueles que supõem que todas as músicas de Michael Jackson devem ser sobre Michael Jackson, é importante notar que ele começa essa faixa com a voz de outra pessoa. Quando ele entra, ele está apenas habitando e testemunhando para essas previamente ignoradas ou desconhecidas vozes. Isso é, dessa forma, um ato de identificação e fortalecimento.

A letra por toda a música é uma das mais convincentes e provocantes de Jackson. “Diga-me o que aconteceu com meus direitos”, ele canta. “Eu sou invisível porque você me ignora? Sua proclamação me prometeu liberdade”. Ele, mais tarde, fala daqueles que são vítimas do ódio, vergonha e da brutalidade policial. “Você me privou do meu orgulho”, ele canta da perspectiva do oprimido. “Eu não acredito que esta é a terra de onde eu vim.”

 Na ponte, um chanfrado solo de guitarra segue solto sobre o turbilhão de efeitos de sintetizadores e camadas de forte percussão, palmas, e uma sampleada revista policial. “A seção da ponte consistia de mais de 300 faixas”, recorda o engenheiro assistente Rob Hoffman. “[No estágio inicial da música] foi basicamente uma trilha de cliques... Com Michael e Brad adicionando novos elementos de percussão todos os dias e Andrew e eu construindo bibliotecas de amostras para ela toda a noite. Bastões, palmas, tambores, batidas [O] groove básico foi iniciado no MPC, o resto da percussão foi EIII e EIIIxp; o 909 de Brad [Buxer] é o chute principal. Alguns dos loucos scanners fx e sons foram adicionados bem no fim, por Chuck Wild. A ponte da música é louca. Nós tínhamos toneladas de programadores e guitarristas entrando, e todo mundo enchia a própria 24 track tape com overdubs... Eddie [De Lena] e Michael editaram e compilaram isso para um manejável número de faixas para Bruce [Swedien] mixar.”

Jackson trabalhou com o renomado cineasta Spike Lee para os dois excelentes vídeos musicais para a canção. O primeiro foi filmado em uma favela pobre no Rio de Janeiro, Brasil. Inicialmente, as autoridades do governo local tentaram impedir o vídeo de ser filmado, temendo que isso fosse atrair atenção para a pobreza da cidade. “Eu não vejo por que nós deveríamos ter de facilitar filmes que iriam contribuir com nada para todos os nossos esforços em reabilitar a imagem do Rio”, disse o Secretário da Indústria, Comércio e Turismo, Ronaldo Cezar Coelho. Mas muitos residentes sentiram diferentemente. “Todo mundo, de repente, está prestando atenção no Santa Marta, falando sobre condições sociais, sanitárias e outras condições aqui”, Sr, de Souza, um residente local, disse ao New York Times. “É um mundo pobre cercado por um mundo rico, uma ilha de miseráveis cercada pela riqueza.” Tribunais acabaram por decidir em favor de permitir Jackson e Spike Lee a filmarem o vídeo, o qual mostra o cantor em um jeans casual e camisetas locais, dançando e se envolvendo com as pessoas em vários locais por toda a cidade.  

Em uma movimentada rua calçada, ele dança ao lado de duzentos membros de um grupo de percussão afro-brasileiro, Olodum, que traz uma energia crua e imediatismo à faixa. Enquanto o vídeo não recebeu muita atenção nos Estados Unidos, ele teve um apelo internacional e fez uma declaração política que usou o Rio de Janeiro como um microcosmo para pobreza em todo o globo. Mas ele também mostrou a vitalidade e a energia das pessoas. A química entre Jackson e as pessoas é extraordinariamente natural e espontânea. Através da musica e da dança, o vídeo sugere, vem uma alegre solidariedade que pode, potencialmente, combater barreiras opressivas. 

O segundo vídeo foi gravado em uma prisão de Nova Iorque e foi imediatamente banido pelas redes de TV, devido à montagem de perturbadoras imagens dele, incluindo espancamentos policiais, guerra, e fome. Por causa do banimento, (ironicamente), a maioria das pessoas nunca viu a versão prisão, o qual é um dos mais corajosos vídeos da carreira de Jackson. A filmagem na prisão carrega profundas implicações, não meramente sobre literais condições de prisões, mas também sobre a condição de pessoas comuns em uma sociedade disciplinada por constante vigilância e uma mais internalizada forma de poder. Jackson entrega a mensagem dele, vestido como um prisioneiro ele mesmo. Junto com os colegas presidiários dele, ele impetuosamente desafia o status quo, pulando em mesas, erguendo o punho dele, liderando uma rebelião de prisioneiros, batendo nas mesas exigindo justiça e humanidade. “Algumas coisas na vida, eles simplesmente não querem ver”, ele canta. Mas no vídeo, Jackson se certifica de que algumas dessas perturbadoras realidades serão reveladas. Isso não é divertido ou fácil de assistir como “Beat It”, mas certamente reforça a poderosa expressão de revolta e injustiça da música.

 


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