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sábado, 8 de setembro de 2012

Livro Man In The Muscis - Capítulo I "Off The Wall"

“Eu estou interessado em fazer um caminho, em vez de seguir uma trilha e isso é o que eu quero fazer na vida – em tudo que eu faço.”

MICHAEL JACKSON, EBONY, 1979



CAPÍTULO 1 OFF THE WALL

LANÇADO: 10 de agosto de 1979
PRODUTOR: Quincy Jones
NOTÁVIES CONTRIBUIDORES: Rod Temperton (compondo/arranjo), Bruce Swedien (engenheiro de gravação), Stevie Wonder (compondo), Paul McCartney (compondo), David Foster (compondo), Carol Bayer Sager (compondo), Tom Bahler (compondo), Patti Austin (vocais), Greg Phillinganes (teclado, arranjo), Steve Porcaro (teclado/sintetizador), Paulinho Da Costa (percussão), Johnny Mandel (cordas), Jerry Hey e The Seawind Horns (instrumentos de sopro)
SINGLES: “Don’t Stop ‘Til You Get Enough”, “Rock With You”, “She’s Out of My Life”, “Girlfriend”
ESTIMATIVA DE CÓPIAS VENDIDAS: 25 milhões




Off The Wall fez pelo R&B o que o Pet Sounds dos Beach Boys fez pelo rock. Foi um ponto de reviravolta, uma revelação sonora e destilação de uma era e estado de espírito. O crítico Rob Sheffiel o chamou de o álbum que “inventou o pop moderno como nós o conhecemos”.

Na verdade, enquanto ele não explora a vasta gama de temas de Jackson, que viria em álbuns subsequentes, Off The Wall captura perfeitamente a expiração e a energia, os desejos reprimidos e dolorosas alegrias dos momentos da juventude. Isso representa Michael Jackson e, por extensão, os ouvintes dele, quando o mundo parecia maduro de possibilidades. Muitos críticos e ouvintes, da mesma forma, agora, consideram-no a pura expressão do gênio de Jackson.

Devido ao sísmico impacto cultural de Thriller, é sempre esquecido que, em 1981, Off The Wall foi o álbum mais vendido de todos os tempos por um artista negro. Seria um registro sem precedentes para a Billboard Top Ten hits (dois dos quais chegaram a 1º posição). Talvez o mais importante, ele foi o álbum que, efetivamente, marcou a transição de Michael Jackson de uma estrela infantil para um maduro artista solo. Antes de ele ser lançado, Jackson ainda era mais bem conhecido como o precoce prodígio de dez anos de idade, do antigo Jackson 5. Depois de Off The Wall, não havia enganos: Michael Jackson, o então “Príncipe do Pop”, tinha chegado. Ele tinha vinte anos de idade.



















Um Jackson de dezessete anos olha para New York, admirado.


Off The Wall foi lançado no verão de 1979. Era um tempo de indisposição política, mas de cultural vibração, na América. Enquanto o presidente Jimmy Carter enfrentava uma crise de energia, uma recessão e a crise do refém do Irã, muitos americanos se voltavam para a música e para a dança para escapar. Disco era, em essência, a menos espiritualmente inclinada psicodélica dos últimos anos da década de setenta e as boates eram as novas comunidades hippies, o espaço onde música, drogas e sexo convergiam. Jackson, que celebrava seu vigésimo primeiro aniversário no estúdio 54, de várias formas, “parecia inteiramente em sintonia com o tempo, tornando-se maior de idade no epicentro da cena da vida noturna, varrendo a cultura e criando um som inteligente e sexy para ela.” Mas ele, também, de alguma forma, destacou-se de tudo isso, “um, estranhamente, inocente menino na era do Boggie Nights’ flashes, intocado por sexo ou drogas, apesar de toda a maníaca indulgência em torno dele, uma Testemunha de Jeová perdida na cúpula do prazer”.

“Pessoas vem ao (Estúdio 54) como personagens”, ele observou, “e é como ir a um jogo”.

Na verdade, enquanto Jackson se abstinha dos prazeres hedonistas da vida de boate, ele também era fascinado pela teatralidade dela. “As pessoas vêm ao (Estúdio 54) como personagens”, ele observou, “e é como ir a um jogo. Eu penso que essa é a razão psicológica para a loucura disco: você se torna aquele sonho que você quer ser. Você simplesmente fica louco com as luzes e a música e você está em outro mundo”.

Esse “escapismo”, como Jackson sempre se referia a isso, tornou-se uma fascinação ao longo da vida, pois fez a ideia da transformação, de se tornar algo diferente e novo. Não todos, porém, estavam tão intrigados com o efeito transformativo do disco. O ano de 1979 viu uma séria reviravolta contra a estética dance-driven, como demonstrado no movimento “Disco Sucks” e no infame “Disco Demolition Night”, no Comiskey Park, em Chicago, onde uma enorme pilha de álbuns de disco foi queimada no jardim central, causando um motim, a partir de uma multidão estridente de noventa mil pessoas. Off The Wall, interessantemente, foi lançado em menos de um mês após esse evento.

Além das demonstraçõs públicas, críticos musicais eram, naquela época, quase universalmente céticos sobre o disco, favorecendo, em vez disso, a “autenticidade” e “seriedade” do rock. Enquanto o rock empurrava os limites contra a cultura dominante, críticos argumentavam, disco era escorregadio, produto artificial destinado à audiência de massa consumidora. Embora essa declaração contivesse alguma verdade – disco, como qualquer gênero popular de música, poderia ser e era, às vezes, insipido e comercialmente calculado –, também revelava alguns vícios óbvios. Em 1979, depois de tudo, o estereotipado e comercial rock estava tão prevalente como o disco. Pelo menos parte da antipatia parecia resultar de uma longa data. Algumas vezes da subconsciente estigmatização da música “negra” que tinha previamente se manifestado na segregação do R&B, soul e funk do rock.

Disco evoluiu de estilo musical predominantemente negro, transformando em funk, com um acompanhamento mais luxuoso de cordas, buzinas, instrumentos desopro, guitarras elétricas e sintetizadores, e batidas flor-on-the-floor. Abrangendo  som dele, mensagem e audiência, disco, no seu melhor, encorajava a diversidade, aceitação e experimentação, tornando-a a estética musical de escolha de muitas minorias, incluindo não apenas negros, mas também gays, hispânicos e mulheres, na metade para o fim dos anos setenta. “Disco era, diametralmente, oposta à postura machista do rock branco”, observa o crítico cultural Daryl Easlea, “e desde que não havia bandas em disco, turnês ou camisetas souvenirs eram difíceis de quantificar. Poucos jornalistas escreveram apaixonadamente sobre isso, mas na maior parte, era ignorado ou tratado com desdém”. Na verdade, descrições irônicas sobre a efeminação, a teatralidade, a extravagância emocional e até mesmo a habilidade do disco fazer as pessoas sentirem vontade de dançar não eram meramente observações neutras. Como Craig Werner escreveu, “Os ataques ao disco deu voz respeitável aos mais feios tipos de racismos desconhecidos, sexismo e homofobia.” (Interessantemente, no início da carreira adulta de Jackson, esses mesmos ataques, particularmente pela percepção de efeminação, androgenia e homossexualidade, eram, constantemente, lançados a ele da mesma forma.).

Disco, é claro, não era a única presença na música. Os últimos anos da década de setenta também deram origem às Músicas de Stevie Wonder em The Key of Life, e The Wall, de Pink Floyd; Hotel California, do Eagles, Rumours, de Fleetwood; Mac e News of the World, do Queen. Disco, prog rock, glam rock, soft rock, punk e pop todos competiam em uma envolvente e elétrica cena musical. O mundo ainda estava sentindo a reverberação do álbum blockbuster, de 1977, o Sturday Nitght Fever, e artistas como Bee Gees, Donna Summer, Chic e Sledgehammer Sisters, dominavam os charts.
Nesse contexto, o disco-pop visceral de Off The Wall parecia muito um reflexo do gosto do momento. Mas parte do que distingue o álbum, antes e agora, decorre do dinamismo dele, a sustentada tensão que ele bate entre opostos. Diferentemente de muitos discos anteriores dos anos setenta, Off The Wall não é meramente uma celebração de excessos. É um álbum tanto de inocência quanto de experiência, de timidez e deslumbramento, tanto quanto de indulgência. Era muito sensual, mas sutil, sempre eufemisticamente. Nunca fala de política, mas é implicitamente político, nunca fala de raça, mas quebrou inúmeras barreiras raciais. Não se refere a nada especificamente sobre o contexto histórico, mas claramente significa, para muitos dos ouvintes, um momento específico no tempo. Ele é disco, mas também é jazz, pop, funk, soul, R&B e Brodway. Off The Wall, portanto, é um álbum difícil de classificar. A indefinição dele, porém, é o que o torna tão convincente.

O trabalho com Off The Wall começou, oficialmente, em dezembro de 1978, no estúdio de gravação Allen Zentz, em Hollywood. O último ano tinha sido um momento de dramática mudança e evolução para Michael Jackson. Depois de anos se sentindo pressionado pelas expectativas da família, ele, finalmente, começou a cortar vínculos com o dominador pai dele. Off The Wall seria, também, o primeiro álbum sem o envolvimento dos irmãos dele, a Motown, ou o dueto da Filadélfia, Kenny Gamble e Leon Huff. Além disso, ele acabara de desempenhar o papel de Espantalho no filme The Wiz, uma adaptação urbana do sucesso da Brodway, ao lado do ídolo dele, Diana Ross.  Exceto por turnês, esta era a primeira vez que ele vivia fora de casa. Naquela nova situação, observou o produtor Bob Cohen, ele era “como uma criancinha em um playground de Mahatma”. Enquanto The Wiz, definitivamente, desapontou nas bilheterias, Jackson era, geralmente, visto como um dos poucos pontos luminosos, recebendo elogios pelo “genuíno talento como ator” e profissionalismo.

O mais importante foi que The Wiz conectou Jackson e o legendário produtor Quincy Jones, que estava escrevendo a trilha sonora para o filme. Jones carregava consigo uma fortuna em experiência, conhecimento e habilidades. Nascido no sul de Chicago, ele foi uma talentosa e ambiciosa criança, já arranjando e escrevendo músicas na adolescência. Quando ele conheceu Jackson, em 1977, o currículo dele incluía viajar pelo mundo, muitas vezes, com músicos parceiros do jazz, receber uma educação clássica em Paris, compor trilhas de filmes premiadas e trabalhar com lendas como Frank Sinatra, Sammy Davis Jr., Dinah Washington, Nat King Cole, Ray Charles e Count Basie. Assim como Berry Gordy, Jones era um pioneiro para os afro-americanos na indústria da música e, como Jackson, ele era um compulsivo perfeccionista.
 
































A música e a personalidade de Jackson, paradoxalmente, incorporavam e
desafiavam as qualidades do disco.


Dada a pedigree, é notável o quão rápido Jones ficou impressionado pelo, então, adolescente de dezoito anos, Michael Jackson. O papel de Jackson em The Wiz era o primeiro dele como ator. Quando o filme começou, ele nem mesmo tinha uma canção própria. “A maioria das pessoas envolvida com o filme não tinha ideia de quem Michael Jackson era”, Jones se lembra. Contudo, quando Jones viu Jackson em ação, a preparação dele, os instintos dele, a ambição dele, ele se convenceu de que o jovem artista era um talento único em uma geração, comparando-o a Sammy Davis Jr. e Frank Sinatra. “Michael foi a melhor coisa que veio de The Wiz para mim”, ele escreveu. “Quando nós ensaiávamos as cenas musicais... eu ficava cada vez mais impressionado. Ele estava sempre superpreparado. Ele chegava às 5 da manhã, para a maquiagem de espantalho dele e tinha cada detalhe do que ele precisava fazer memorizado para cada cena. Ele também sabia todos os passos de dança, todas as palavras do dialogo e todas as letras de todas as músicas de todos, na produção inteira.” Além da preparação, Jones viu em Jackson aquele raro fator “x”. “(Michael Jackson) tinha o conhecimento de um homem de sessenta anos e o entusiasmo de uma criança”, Jones observou. “Ele era um menino genuinamente tímido e belo, que escondia a inteligência dele com pequenos sorrisos e risinhos. Mas sob o exterior tímido estava um artista com um incandescente desejo por perfeição e uma definitiva ambição de ser o maior artista do mundo.”


Jackson na première de The Wiz, onde ele encontrou Quincy Jones pela primeira vez. Eles começariam a trabalhar no primeiro álbum solo dele, Off The Wall, esse mesmo ano.


Enquanto filmava The Wiz, Michael Jackson, igualmente, desenvolveu uma admiração por Quincy Jones e se convenceu de que ele seria perfeito para produzir o primeiro álbum solo dele. “Quincy faz jazz, ele faz trilhas de filme, rock ‘n’ roll, funk, pop, ele é multicolorido e esse é o tipo de pessoa com quem eu gosto de trabalhar”, Jackson explicou em uma entrevista em 1980. “(Off The Wall) foi a primeira vez que eu escrevei e produzi completamente minhas músicas e eu estava procurando por alguém que me desse essa liberdade, além de alguém que é ilimitado musicalmente.”

Assim, Jones pôde não apenas ver o enorme potencial de Jackson, mas isso também o encorajou a fechar um acordo com o cantor. Quando a Epic Records rejeitou a ideia de uma colaboração Jackson-Jones, porque Jones era “muito jazzy” e não podia produzir sólidos hits de dança, Jackson não recuou. “Ele marchou para a Epic com (os empresários dele)”, Quincy recorda, “e disse: ‘Eu não me importo com o que vocês pensam, Quincy está fazendo meu álbum. ’” Jackson venceu e, eventualmente, o mesmo aconteceu com a Epic Records.

Além de atuar como produtor, Quincy Jones ajudou Jackson a reunir um elenco de apoio formado por estrelas, incluindo o prestigiado engenheiro de gravação, Bruce Swedien, de quem Jones era amigo íntimo, desde os anos cinquenta. Swedien permaneceria com Jackson por toda a carreira solo dele, proporcionando uma amizade, assim como “um dos melhores pares de orelhas” no negócio. Completando com quem sempre se referiam como a “Grande Árvore”, o britânico Rod Temperton, um membro de uma banda funk-disco internacional, a Heatwave. Temperton era um talentoso músico a quem Jones descreveu como “um dos melhores compositores que já viveu, com um talento melódico e polifônico e instinto de um compositor clássico”. Devido à reputação dele como um hip e funky membro do grupo de disco Heatwave, muitos dos músicos que trabalharam em Off The Wall ficaram surpresos em saber que ele era um “pequeno cara branco”, de North Lincolnshire, Inglaterra. Mas musicalmente, Temperton, naturalmente, se ajustava com Jones, Swedien, Jackson e o resto do time. “Rod era uma alma gêmea em muitos aspectos”, Jackson disse. “Como eu, ele se sentia mais em casa cantando e escrevendo sobre a vida noturna que realmente saindo e vivendo isso.”

Além de a Grande Árvore, Jones e Jackson aproveitaram o talento como compositor de algun dos maiores nomes na indústria musical, incluindo Paul McCartney, Stevie Wonder, Carole Bayer Sager, Tom Bahler e David Foster. Eles também trouxeram alguns músicos excepcionais: “o virtuoso tecladista” Greg Phillinganes, um amigo de Jackson, que trabalhou intimamente com Michael nas faixas rítmicas, o “monstro trompetista e arranjador”, Jerry Hey, e o talentoso Seawind Horns; o vencedor do Grammy Award, o compositor e arranjador Johnny Mandel, nas cordas; Louis Johnson (dos Brothers Johnson), no contrabaixo; David Jones e Melvin, “Wah Wah Watson”, Fera na guitarra; John Robson e Jeff Porcaro (do Toto) nas baterias e o brasileiro Paulinho Da Costa na percussão. Quincy Jones, afetuosamente, se referia a esta extraordinária coleção de talentos como “Time-A”.

Em retrospecto, coordenar esse diverso grupo de tal forma perfeita foi um extraordinário ato de colaboração artística. “Ele foi o álbum mais suave em que eu já estive envolvido”, Jackson disse em uma entrevista em 1979. “Havia muito amor, foi incrível. Todos trabalharam juntos muito facilmente.” Era uma atmosfera de receptividade e confiança que Quincy ajudou a promover e que Jackson aprenderia e executaria como produtor executivo em projetos posteriores. “Nós estávamos apenas pegando muitas chances”, recorda Jones. “Sentíamo-nos livres.”


















                                                                        
Depois de retornar de The Wiz, Jackson estava ávido por mais independência, especialmente, do pai dele.



Essa liberdade, espontaneidade e espírito de colaboração foram incorporados às faixas. “Em um par de músicas a banda estava lá enquanto eu cantava e nós fomos capazes de sentir um ao outro”, Jackson disse em uma entrevista em 1979. “E isso ficou marcado no álbum. Eu nunca tinha feito assim antes, jamais! Isso deu tal espontâneo sentimento e me lembrou de quando o R&B primeiro começou no Sul e todos os negros simplesmente se reuniam em um barraco e faziam uma Jam. Isso é o que falta hoje. Tudo é muito comercial e mecânico. Muitos músicos hoje estão compenetrados no que eles fazem para eles mesmos e não um com o outro.” Como artista, Jackson sempre acreditou nessa energia comum como parte integrante da criatividade.


Michael Jackson e Quincy Jones, capturados aqui em 1993, formariam uma das mais bem sucedidas parcerias criativas na história da música popular.


O primeiro foco de Quincy Jones, entretanto, foi em Michael Jackson. “Nós tentamos todos os tipos de coisas que eu tinha aprendido ao longo dos anos para ajudá-lo com o desenvolvimento artístico dele”. Jones recorda. “Escutando música para relaxar, apenas um ‘terceiro menor’ para dar a ele flexibilidade e uma variedade mais madura nos registros altos e baixos e mais de que algumas mudanças de tempo. Eu também tentei dirigi-lo com músicas que tinham mais profundidade. Algumas delas sobre relacionamentos. Seth Riggs, um treinador de voz, deu a ele vigorosos exercícios de aquecimento par expandir as faixas superiores e inferiores dele por, pelo menos, uma quarta, o que eu, desesperadamente, precisava para que os vocais dramáticos fluíssem.”





















Um pensativo Jackson no set do vídeo
 musical dele, Can You Feel It, em 1980.


Jackson respondeu ao desafio, impressionando os colegas mais experientes dele, não apenas com o talento, mas com a preparação dele. Jones se lembra dele vindo para as sessões no estúdio com as partes dele completamente memorizadas, letras, harmonias, tempo. “Ele podia vir para uma sessão e fazer duas vozes guias e três partes de vozes de fundo em um dia”, Jones disse em uma entrevista em 1982. “O tempo de um estúdio é muito caro e é por isso que alguém como Michael Jackson é o artista que o produtor sonha. Ele anda preparado. Ele realizava muito em uma única sessão, isso me impressionava.”

Quincy e Michael vasculharam através de dúzias de músicas potenciais para Off The Wall, algumas delas escritas por Jackson e algumas introduzidas por Jones, Temperton e outros. Eles queriam apenas o mix certo de sons e estilos e tentaram colocar faixas que destacariam as habilidades diversas de Jackson. Enquanto fazia o álbum, Jackson também desenvolveu uma saudável competição com o colega compositor Rod Temperton. “(Um dia)”, Jackson recorda, “ele veio ao estúdio com este super (ritmo), ‘doop, dakka dakka doop, dakka dakka dakka doop’, essa completa melodia e refrão, ‘Rock With You’, eu fui, ‘Wow! Então, quando eu escutei isso eu disse: ‘Okay, eu realmente tenho que trabalhar agora’. Assim, toda vez que Rod apresentasse alguma coisa, eu apresentaria alguma coisa, e nós tínhamos uma pequena forma de competição amigável”. Jackson comparou isso à forma como Walt Disney levou diferentes artistas a competir para animar um filme. “Quem tivesse o efeito mais estilizado que Walt Disney gostasse, ele escolheria... era como algo amigável, mas era uma competição... Portanto, sempre que Rod trazia algo, eu traria algo... Nós criamos esta coisa maravilhosa.” Temperton e Jackson não apenas terminariam compondo a maioria das músicas de Off The Wall, mas de Thriller também.

Eventualmente, Jackson e Jones diminuíram a longa lista de potenciais faixas musicais a dez músicas: Três (“Don’t Stop Till You Get Enough”, “Workin’ Day and Nigth” e “Get on the Floor”) eram composições de Jackson. Três outras (“Rock With You”, “Off the Wall” e “Burn the Disco Out”) eram contruibuições de Rod Temperton. Finalmente, “Girfriend” veio de Paul McCartney, “She’s Out of My Life”, veio de Tom Bahler (que trabalhou com Jackson em The Wiz), Carole Bayer Sager trouxe “It’s the Falling In Love” e Stevie Wonder contribuiu com “I Can’t Help It”.
























Jackson, fotografado aqui de terno, queria 
apresentar uma nova, mais madura, imagem 
ao público.


Enquanto os retoques finais estavam sendo dados nas músicas no estúdio Westlake e Cherokee, as atenções estavam voltadas para a capa do álbum e para a imagem do novo artista. Para muitas pessoas, apesar do recente sucesso de Destiny, Michael Jackson continuava estigmatizado como um angelical artista infantil dos Jackson 5. “Até agora”, escreveu Stephen Holden da Rolling Stone, em 1979, “(Jackson tem), compreensivamente, se agarrado às reminiscências da original imagem dele da Motown, como Peter Pan, enquanto, cuidadosamente, considera o papel de jovem príncipe”. Um dos principais objetivos de Off The Wall, de uma perspectiva de markenting, portanto, era dar este simbólico passo à frente e introduzir o Michael Jackson adulto, enquanto maduro, educado, sofisticado e sexual. Antes até mesmo de tocar o disco, a nova imagem dele estava exposta da capa do álbum, com Jackson apresentado como o “Frank Sinatra negro”, vestindo um estiloso (para o momento) smoking e cintilando o sorriso megawatt dele. Parecia “uma foto tirada na formatura ou em um casamento, ou em qualquer outro ritual de passagem”, observou Anthony DeCurtis, da Rolling Stones. O empresário de Jackson, naquele tempo, Ron Weisner, alega créditos pelo plano de jogo desta imagem, com exceção das meias brancas ,que, não surpreende, foram ideia de Jackson. (Como um artista, Jackson tem um olho aguçado para imagens icônicas; ele também adora o contraste de cores, que ressalta a percepção do movimento na dança. Posteriores capas de Off The Wall mostrariam apenas a metade inferior de Jackson, destacando as meias brilhantes e os moccosins.). Tanto na embalagem quanto no conteúdo, o álbum serviu como a metamorfose de Jackson para uma pessoa nova, jovem, bem sucedida, adulta.

Off The Wall foi completado em apenas seis meses. “A abordagem de Michael é muito dramática”, lembra Quincy Jones. “Muito concisa. Quando ele concebe uma ideia ele vai todo o caminho com ela. Ele tem a presença de espírito para sentir alguma coisa, concebê-la e, então, trazê-la à vida. É um longo caminho da ideia à execução. Todo mundo quer ir ao céu e ninguém quer morrer. Isso é energia, homem. Você precisa ser emocionalmente preparado para colocar tanta energia dentro disso quanto é necessário para fazer direito.” Depois de todo o trabalho e energia investidos no álbum, tanto Jones quanto Jackson estavam, justificadamente, orgulhosos do produto final. Off The Wall era um álbum firme, rico, multifacetado, em todas as faixas. “(Quincy e eu) dividimos a mesma filosofia sobre fazer álbuns”, Jackson escreveu mais tarde. “Nós não acreditamos em lados-Bs ou músicas de álbuns. Todas as músicas devem ser capazes de se sustentar como singles e nós sempre buscamos isso.”

A abordagem Jackson-Jones também significou uma diversa, mas equilibrada, linha de canções. Eles queriam que contivesse algo para todos, mas ainda soasse como pertencentes a um conjunto.

O álbum foi lançado em agosto de 1979, para um público curioso. Primeiro single, “Don’t Stop Till You Get Enough”, já tinha alcançado a 1º posição no chart da Billboard, em julho, e estava sendo tocado nas boates por todo o país. Contudo, até o álbum ser escutado integralmente, as pessoas não começaram a perceber que algo especial tinha sido formado na parceria de Michael Jackson e Quincy Jones. “Fãs e parceiros da indústria da música, igualmente, ficaram de boca aberta quando o (o álbum) foi emitido para o público”, escreveu o biografo J. Randy Taraborrelli. Na verdade, é difícil  imaginar completamente, agora,  a experiência das pessoas ao tocar o álbum ou fita cassete, pela primeira vez, e escutar o transbordante ritmo, a textura colorida e o êxtase desenfreado dele.

Em adição aos dois hits em 1º posição do álbum, (“Don’t Stop Till You Get Enough” e “Rock With You”), outros dois (“Off The Wall” e “She’s Out of My Life”) chegaram ao Top Ten em 1980. Enquanto isso, o álbum permaneceu no Top 20 por uma marca incrível de quarenta e oito semanas. Em 1982, ele já tinha chegado a, aproximadamente, sete milhões de cópias vendidas nos Estados Unidos sozinho, fazendo dele o álbum de um artista negro mais vendido de todos os tempos.

Ele simbolizava um importante marco cultural, com certeza. Para muitos ouvintes e críticos, porém, a música, por si mesma, era revolucionária. Off The Wall era uma nova geração de álbuns, uma síntese de gêneros e músicas única. Na revisão do álbum, em 1979, a Rolling Stone o chamou de “uma amostra original, sofisticada de R&B-pop”; All Music descreveu-o como “uma intoxicante mistura de fortes melodias, ganchos rítmicos e sua construção indelével... que é, absolutamente, emocionante em sua alegria absoluta”; Blender afirmou “(ele) olhou para além do funk, para o futuro da dance music e para além das baladas soul para o futuro das canções tocantes, na verdade, para além do R&B, para o pop sem preconceitos”.












              








                     Com Off the Wall, Jackson não apenas reinventou 
                   a si mesmo, mas revolucionou o gênero R&B.

Enquanto não manifestamente um portador de mensagens, os temas implícitos dele eram tão importantes quanto. Off The Wall era, definitivamente, uma celebração de diferenças e excitamento, de emoção e imediatismo, de libertação e transformação, era uma escapatória temporária do “mundo real”, da monotonia e conformidade da alma mortal, um convite para se sentir vivo, jovem, único e livre. Se o famoso “muro” de Pink Floyd foi um símbolo da isolação do narrador, o de Michael Jackson era uma barreira que deveria ser saltada, mesmo que a estimulante liberdade fosse transitória. Como Jackson canta na faixa título, “Deixe a loucura na música entrar em você... A vida não é tão ruim assim/ Se você vive loucamente.” Letras como essas não apenas ressonavam com Jackson em um nível pessoal, mas também falavam para milhões de outros, no final dos anos setenta, que se reuniam na pista de dança e nas boates, experimentando abertamente com identidade e sexualidade.
Talvez a maior realização de Off The Wall, porém, esteja na ousadia sonora dele. “(Ele) é um álbum dançante lançado no auge da febre disco, mas inclui nenhum dos gêneros clichés”, observa o crítico musical Anthony DeCurtis, “Os ritmos são suaves, mas propulsivos, carregados, mas graciosamente sincopados; as melodias são claras como ar, mas imediatas e inesquecíveis.” Barney Hoskyns da NME o descreveu com o “o dance music mais intrincadamente temporizado, completamente texturizado, brilhantemente sensual, já feito.”

As camadas de instrumento complementam, mas nunca se sobrepõem aos alternativamente zombeteiros, sensuais e sublimes vocais de Jackson. “Jackson trouxe para Off The Wall faixas vocais que nenhum cantor pop, antes ou depois, poderia ter imaginado”, escreveu o crítico musical Jimmy Gutterman. “O tenor dele voa por todo o lugar (mesmo semi-rapping um pouco em “Get On The Floor”), mas os momentos vocais mais expressivos, aqui, são sem palavras: choros, gritos, exultações, gemidos, que falam muito.”

Considerando o enorme sucesso comercial do álbum e a aclamação da crítica, após o lançamento, não é de se admirar que Jackson tenha se sentido tão devastado quando o álbum foi esnobado no Grammy Awards, em 1980, (recebendo apenas uma indicação para o Best Male R&B Vocal Perfomance). “Eu me lembro de onde eu estava quando eu recebi a notícia”, Jackson recorda. “Eu me senti ignorado pelos meus colegas e isso doeu.” Membros da família se lembram dele chorando inconsolavelmente. “Jackson sentiu que a indústria da música estava tentando mantê-lo no lugar dele, como um artista de único estilo”, observou a Rolling Stone, “um cantor negro que faz dance music”. Jackson, porém, recusou-se a aceitar esse fato. “Aquela experiência acendeu um fogo na minha alma”, ele mais tarde escreveu. “Tudo sobre o que eu podia pensar era o próximo álbum e o que eu faria com ele. Eu queria que fosse realmente incrível.”

Apesar de ter sido esnobado pelo Grammy, Off The Wall venceu o teste de tempo. Para muitos daqueles que se tornaram maiores de idade nos anos setenta, ele é definido como o álbum da jovem vida deles. “Se você me pedir para escolher entre Off The Wall e todo o catálogo anterior de The Sex Pistols e The Beatles”, escreveu o crítico musical Mark Fisher, “não haveria competição. Eu respeito The Beatles e os Pistles, mas eles já tinham sido calcificados nos arquivos das revistas cinematográficas, antes mesmo que eu desse ouvidos a eles; enquanto Off The Wall continua vívido, irresistível, suntuoso, repleto de detalhes tecnicolor”.

Na verdade, mais de trinta anos, desde que ele foi lançado, ouvintes e críticos, igualmente, são praticamente unânimes em elogiá-lo. Em uma pesquisa da VH1 com mais de setecentos músicos, compositores, disc jockeys, programadores de rádio e críticos, em 2003, Off The Wall foi classificado como trigésimo-sexto melhor álbum de todos os tempos. A Rolling Stone o classificou como 68 na lista dos 500 Greates Albuns of All Time. Em 1999, a revista Q, do Reino Unido, o chamou de “um dos melhores álbuns já feitos... (com) uma das melhores melodias da história do pop”.

Off The Wall também inspiraria várias gerações de artistas que viriam, incluindo Prince, Janet Jackson, Usher, Justin Timberlake, Alicia Keys, Jay-Z, Kanye West, Ne-Yo, e Beyoncé, além de centenas de outros, servindo como o que o crítico musical John Lewis tem chamado de “Pedra Rosa para toda a subsequente R&B”.


                           Jackson, cintilando com lantejoulas no set do vídeo musical para o
                           hit #1 dele, Off The Wall.